No seu artigo de opinião no jornal Público, o Bastonário da Ordem dos Notários, Jorge Batista da Silva, defendeu que a estratégia de combate à corrupção em Portugal é insuficiente, afirmando que o país adota uma abordagem formalista, mais focada em cumprir com relatórios internacionais do que em resolver efetivamente o problema.
O Bastonário salientou que a corrupção custa aos contribuintes mais de 18 mil milhões de euros por ano, cerca de 8% a 9% do PIB. Contudo, alertou que o impacto real vai além dos números, minando a confiança nas instituições democráticas e prejudicando o crescimento económico e a justiça social.
Jorge Batista da Silva afirmou que "a máquina não funciona bem" e criticou a fragmentação de esforços entre múltiplos organismos. "Em vez de centralizarmos numa entidade única, com poderes reforçados e competências para definir políticas eficazes, temos uma estratégia para ser formalmente um bom aluno no combate à corrupção, mas que não resolve a situação", sublinhou.
Para o Bastonário, o combate à corrupção deve ser "um compromisso multissectorial", alocando recursos humanos e tecnológicos adequados para enfrentar crimes financeiros complexos e transnacionais. A formação contínua e o uso de novas tecnologias, como a inteligência artificial, são essenciais para melhorar a deteção de fraudes e lavagem de dinheiro.
Dando o Regime Central do Beneficiário Efetivo (RCBE) como exemplo, Jorge Batista da Silva afirmou que "a aplicação deste regime apenas tem servido para atrapalhar a vida das empresas", sem vislumbrar "qualquer utilidade prática no combate ao branqueamento de capitais".
O Bastonário também se debruçou sobre o setor imobiliário, um dos mais vulneráveis à corrupção, apontando que, apesar das restrições à utilização de dinheiro acima dos 3000 euros e a obrigatoriedade de detalhar transações, "continua a ser demasiado fácil contornar a lei". "Por exemplo, nas escrituras, tornou-se obrigatório indicar o meio de pagamento, mas depois não se verifica se o cheque foi depositado ou se o plano de pagamento foi cumprido", explicou.
A discrepância entre o Valor Patrimonial Tributário (VPT) e os valores reais de mercado dos imóveis também foi destacada como um facilitador da subdeclaração de preços, permitindo a lavagem de dinheiro.
Apesar dos esforços da Ordem dos Notários, que tem reforçado a formação e estar a criar uma ferramenta para apoiar o cumprimento das obrigações legais, Jorge Batista da Silva apontou a falta de feedback das entidades responsáveis e a natureza burocrática dos processos.
"Não vamos acabar com a corrupção amanhã, mas podemos tentar hoje melhorar os nossos mecanismos de controlo", concluiu.